Propósito como um recurso importante na era COVID-19

Por Sofia Coelho

Em Julho de 2020, na revista científica Journal of Humanistic Psychology, Allison White publicou um artigo que explora como um sentido de propósito pode servir como um importante recurso psicológico durante a pandemia da COVID-19. Mas o que é isto do “sentido de propósito”?

O propósito na nossa vida pode ser definido como uma intenção significativa e relativamente estável que guia o comportamento. Propósito caracteriza-se por um envolvimento ativo que pode contribuir para melhorar o mundo para além de nós.

Alguns estudos sugerem que somos geralmente mais saudáveis física e psicologicamente quando temos uma razão significativa para viver e maneiras de contribuir para o mundo para além de nós próprixs. Ter um sentido de propósito está associado a resiliência, melhores resultados académicos e melhor saúde física (1,2,3,4). Quando orientado para as outras pessoas (isto é, quando é benéfico para outrxs), ter um propósito está também associado a uma maior saúde psicológica, abertura a novas experiências e satisfação (5,6). Além de poder dar significado a tarefas quotidianas, ter um propósito pode também ajudar a mitigar os efeitos de stress e facilitar a recuperação emocional (7,8).

Como desenvolver um sentido de propósito?

Formarmos relações de apoio com pessoas que nos oferecem orientação pode ajudar a facilitar o nosso desenvolvimento de propósito.

Em 2009 Kashdan e McKnight (8) propuseram um modelo do percurso do desenvolvimento de propósito que inclui três caminhos (não mutuamente exclusivos):

  1. Caminho de Aprendizagem Social, através da observação de outras pessoas empenhadas em ações com propósito;

  2. Caminho pró-ativo, através da exploração de atividades gratificantes que nos tragam propósito, como por exemplo escrever, desenhar, ler, aprender ou criar;

  3. Caminho reativo, em resposta a um evento com consequências significativas e que resulta em transformação.

Propósito e COVID-19

A COVID-19 trouxe-nos disrupção nas rotinas e sentimentos de medo e de incerteza. Estas mudanças podem representar um momento inicial do caminho reativo para o desenvolvimento de propósito. As pessoas podem frequentemente transformar experiências desafiadoras em grandes oportunidades, e ter um sentido de propósito empenhado pode oferecer perseverança perante dificuldades.

Outrxs investigadorxs sugeriram também que intenções pró-sociais e envolvimento podem ser precursores de propósito. Como tal, Allison White recomenda que as pessoas debatam as formas como podem fazer a diferença para alguém durante a pandemia. Por exemplo, enviar mensagens de gratidão a profissionais de saúde, fazer esforços para se manterem virtualmente ligados a pessoas importantes ou encontrar plataformas virtuais para voluntariado.

A investigadora deixou também algumas questões para reflexão que podem ajudar a desenvolver propósito através de um caminho reativo, durante a pandemia:

  • Que necessidades vejo no mundo resultantes da pandemia da Covid-19?

  • Quais são os meus valores e como é que estes estão relacionados com a minha experiência durante a Covid-19?

  • Que competências tenho ou quero desenvolver que ajudem a responder às necessidades que observei?

  • Que valores estão refletidos no meu propósito e como posso trabalhar e viver de acordo com estes no meio da pandemia?

  • Que competências únicas tenho que posso oferecer à minha família, amigxs, colegas e restantes pessoas?

  • Que intenção pretendo ter no meu trabalho e vida familiar e como é que os meus contributos importam neste momento?

Estas questões podem ajudar a refletir sobre o nosso propósito.

Apesar dos tempos conturbados e efeitos negativos que a pandemia nos trouxe, a era Covid também pode ser vista como uma oportunidade para desenvolver ou solidificar um sentido de propósito que se constitui como recurso interno bastante importante para lidarmos com adversidades.


Referências

White, A. E. (2020). Purpose as a powerful resource in the time of COVID-19. Journal of Humanistic Psychology, 00(0), 1–8. https://doi.org/10.1177/0022167820940464

  1. Benard, B. (1991). Fostering resiliency in kids: Protective factors in the family, school and community. Far West Laboratory for Educational Research and Development.

  2. Damon, W., Menon, J., & Bronk, K. C. (2003). The development of purpose during adolescence. Applied Developmental Science, 7(3), 119–128. https://doi.org/10.1207/S1532480XADS0703_2

  3. Hill, P. L., & Turiano, N. A. (2014). Purpose in life as a predictor of mortality across adulthood. Psychological Science, 25(7), 1482–1486. https://doi.org/10.1177/0956797614531799

  4. Ryff, C. D. (1989). Beyond Ponce de Leon and life satisfaction: New directions in question of successful ageing. International Journal of Behavioral Development, 12(1), 35–55. https://doi.org/10.1177%2F016502548901200102

  5. Bronk, K. C., & Finch, W. H. (2010). Adolescent characteristics by hope of longterm aim in life. Applied Developmental Science, 14(1), 35–44. https://doi.org/10.1080/10888690903510331

  6. Mariano, J. M., & Vaillant, G. E. (2012). Youth purpose among the “greatest generation.” Journal of Positive Psychology, 7(4), 281–293. https://doi.org/10.1080/17439760.2012.686624

  7. Burrow, A. L., & Hill, P. L. (2013). Derailed by diversity? Purpose butters the relationship between ethnic composition on trains and passenger negative mood. Personality and Social Psychology Bulletin, 39(12), 1610–1619. https://doi.org/10.1177/0146167213499377

  8. McKnight, P. E., & Kashdan, T. B. (2009). Purpose in life as a system that creates and sustains health and well-being: An integrative, testable theory. Review of General Psychology, 13(3), 242–251. https://doi.org/10.1037/a0017152

Carlos Costa