O Prazer de Dar ou “Helper’s High”, O Espírito do Natal

Por Pedro Garcia-Marques

É dia 24 de dezembro, a árvore está montada, o bacalhau está na mesa e soam as 12 badaladas. A família reúne-se e os presentes são desembrulhados. As crianças felizes divertem-se a brincar com os novos brinquedos. Já os adultos estão também maravilhados. Porquê? A verdade é que o segredo do Natal está em dar em não em receber.

O ato de dar pode, à primeira vista, beneficiar apenas quem recebe. Mas, na verdade, também melhora o bem-estar de quem dá.

A este fenómeno dá-se o nome de Helper’s High: um estado emocional e fisiológico positivo que uma pessoa experiencia quando ajuda outras pessoas. Allan Luks, em 1992(1), foi o primeiro a mostrar este fenómeno, quando analisou mais de 300 pessoas e verificou que dar e ajudar era bom para a mente e corpo.

Mais recentemente, evidências do campo da neurociência e psicologia têm suportado a existência deste fenómeno. O neurocientista Jorge Moll(2) descobriu que quando doamos dinheiro para caridade, o nosso cérebro liberta neurotransmissores de bem-estar como a oxitocina, serotonina e dopamina, ativando o circuito de recompensa, que nos permite experienciar prazer com sexo ou comida. A psicóloga Tristen Inagaki(3) apresentou resultados semelhantes, mostrando que quando ajudamos alguém que nos é querido, a região do nosso cérebro que processa recompensas tem um grande grau de ativação, que por sua vez, até reduz o nosso nível de stress. De facto, ajudar pode causar uma experiência fisiológica semelhante à de tomar opióides, aumentando o nosso bem-estar. Um estudo de investigadores da Harvard e British Columbia University descobriu que dar e ajudar pode criar um loop de feedback positivo aditivo: quando experimentamos bem-estar como resultado de doar, é mais provável que venhamos a dar novamente(4).

A ciência é assim bastante clara, quando ajudamos os outros somos recompensados por nós próprios, o nosso cérebro liberta compostos químicos de prazer que nos presenteiam com o caminho para a felicidade.

Se não bastasse sermos recompensados biologicamente por tomar ações altruístas, somos também recompensados fisiologicamente e psicologicamente. Ajudar, dar e doar aumentam o nosso nível de felicidade, independentemente da idade. Num conjunto de estudos realizado por Elizabeth Aknin e Laura Dunn(5), foi demonstrado que quando uma pessoa pode escolher entre receber e dar, apresenta maiores indicadores de felicidade quando escolhe dar. Numa investigação paralela, Ed O’Brien e Samantha Kassirer(6), verificaram que a felicidade de dar, não só parece ser maior do que a felicidade de receber, como também se prolonga durante mais tempo. Porém, os benefícios de ajudar o outro não ficam por aqui. Em diferentes estudos publicados no Journal of Health Psychology(7), foi mostrado que pessoas com atitudes altruístas, como quem faz voluntariado, tendem a apresentar melhores indicadores de saúde e até uma taxa de mortalidade mais baixa do que a do resto da população.

Fica assim cientificamente descodificado o segredo do natal. Dar pode ser melhor do que receber, já que somos intrinsecamente e momentaneamente recompensados com a libertação de químicos de prazer no nosso cérebro, podemos atingir maiores e mais longos níveis de felicidade e podemos até viver mais tempo.


Referências:

(1) Luks, A., & Payne, P. (2001). The healing power of doing good: The health and spiritual benefits of helping others. iUniverse.

(2) Moll, J., Krueger, F., Zahn, R., Pardini, M., de Oliveira-Souza, R., & Grafman, J. (2006). Human fronto–mesolimbic networks guide decisions about charitable donation. Proceedings of the National Academy of Sciences, 103(42), 15623–15628.

(3) Inagaki, T. K., & Eisenberger, N. I. (2016). Giving support to others reduces sympathetic nervous system‐related responses to stress. Psychophysiology, 53(4), 427–435.

(4) Aknin, L. B., Dunn, E. W., & Norton, M. I. (2012). Happiness runs in a circular motion: Evidence for a positive feedback loop between prosocial spending and happiness. Journal of Happiness Studies, 13(2), 347–355..

(5) Dunn, E. W., Aknin, L. B., & Norton, M. I. (2008). Spending money on others promotes happiness. Science, 319(5870), 1687–1688.

(6) O’Brien, E., & Kassirer, S. (2019). People are slow to adapt to the warm glow of giving. Psychological Science, 30(2), 193–204.

(7) Oman, D., Thoresen, C. E., & McMahon, K. (1999). Volunteerism and mortality among the community-dwelling elderly. Journal of Health Psychology, 4(3), 301–316.

Harris, A. H., & Thoresen, C. E. (2005). Volunteering is associated with delayed mortality in older people: analysis of the longitudinal study of aging. Journal of Health Psychology, 10(6), 739–752.

Carlos Costa