Uma Educação Mais Inclusiva: Desafios e Ações

Por Sofia Coelho

Na época em que vivemos, torna-se urgente falar sobre diversidade. Num artigo, publicado em 2019, na revista científica Social Issues, Enrique Neblett da Universidade da Carolina do Norte explicou os desafios relacionados com diversidade, especificamente de raças e etnias(*1), no ensino de Psicologia e propôs estratégias para um ensino mais inclusivo. Neblett questionou professores e alunos da sua universidade sobre os desafios relacionados com diversidade que encontravam e pediu-lhes que sugerissem estratégias para incorporar diversidade e multiculturalismo no ensino e aprendizagem de Psicologia.

Desafios encontrados pelos professores:

  1. Dificuldade em ter conversas complicadas e sensíveis sobre raça;

  2. Tempo limitado para ensinar técnicas e estratégias para lidar com diversidade;

  3. Falta de treino adequado para dirigir discussões altamente sensíveis sobre raça, etnias, e racismo e saber como integrar problemas de diversidade e multiculturalismo nas aulas;

  4. Enviesamento etnocêntrico (foco na perspetiva de pessoas brancas, neste caso) na investigação. Isto é, é difícil evitar perpetuar certos enviesamentos quando os materiais do curso também são em si enviesados, mesmo que acidentalmente;

  5. Representação. É difícil ter discussões sobre diversidade e multiculturalismo quando os professores e alunos não representam uma população diversa.

Desafios encontrados pelos alunos:

  1. Raça raramente é mencionada, sendo que discussões e conversas sobre raça são frequentemente iniciadas por alunos em vez de professores;

  2. Aprofundamento insuficiente de discussões. Por exemplo, uma aluna mencionou que o conceito de enviesamento na força policial foi analisado mas sem qualquer ligação a eventos atuais;

  3. Representatividade, isto é, falta de diversidade entre professores;

  4. Cooperação e investimento da universidade. Alunos mencionaram que seria difícil implementar soluções para estes desafios se tais iniciativas não fossem apoiadas pelos órgãos administrativos da universidade ou do departamento e que, sem alterar a estrutura dos programas ou os métodos de ensino, seria pouco provável existir mudança.

Soluções sugeridas pelos professores:

  1. Recursos científicos sobre diversidade. Saber onde procurar atividades e recursos que facilitem a incorporação de diversidade e multiculturalismo em cursos de Psicologia. Por exemplo, na Universidade da Carolina do Norte, existe já um grupo a desenvolver uma ferramenta online com recursos (artigos e vídeos) que ajudem os professores a criar uma experiência curricular mais diversa e inclusiva;

  2. Treino e workshops. Informar os professores sobre estratégias eficazes para incorporar e ensinar diversidade e multiculturalismo nas aulas e treinar o uso de estratégias para promover sensibilidade a problemas raciais, étnicos e multiculturais. Este tipo de treino ajudaria os professores a iniciar discussões e a moderar eficazmente conversas difíceis;

  3. Técnicas e abordagens pedagógicas. Incluir conteúdo sobre minorias raciais e étnicas e diferenças culturais, destacar as contribuições para a área feitas por minorias, explicar conceitos de perspetivas diferentes e com exemplos reais, promover atividades nas quais os alunos tenham mais tempo para pensar e explicar conceitos.

Soluções sugeridas pelos alunos:

  1. Criação de currículos não-opcionais sobre diversidade para que todos os estudantes tivessem pelo menos uma disciplina sobre uma população especifica sobre ciência da diversidade;

  2. Abordagens formativas e integrativas de ciência da diversidade para que a diversidade seja integrada em todas as aulas de Psicologia;

  3. Mais diversidade de professores, um ensino mais aprofundado, e eventos relacionados com ciência da diversidade.

Medidas e políticas a implementar:

  1. Compromisso e investimento em ciência da diversidade. Compromisso da universidade com a criação de programas, políticas e práticas que fomentem e evidenciem diversidade. Apoio de líderes administrativos e disponibilização de recursos financeiros e esforços para identificar fontes de fundos adicionais para a implementação do ensino da ciência da diversidade;

  2. Planeamento estratégico para que seja estabelecido um plano formal com objetivos específicos para desenvolver programas e iniciativas de treino de ciência da diversidade. Por exemplo, criação de uma ferramenta online ou repositório de recursos para melhoria do currículo e ensino inclusivo e implementação de investigação que permita identificar as estratégias mais eficazes;

  3. Estabelecimento de um comité de ensino em ciência da diversidade, que desenvolva, por exemplo, workshops para melhorar competências de diálogo e comunicação;

  4. Promoção da diversidade de professores e alunos através de recrutamento e implementação de programas para estudantes de minorias raciais e étnicas. Por exemplo, fornecer apoio financeiro para estas iniciativas através de programas de investigação;

  5. Avaliação das abordagens pedagógicas existentes e seleção de métodos de ensino para maximizar um ensino eficaz da ciência (psicológica) da diversidade. Por exemplo, ter no campus arte que reflita diversidade e que traga um sentimento de pertença e interesse aos alunos, criar seminários em que haja mais tempo para discussão, reconhecer a história do racismo em ciência, e fornecer modelos para avaliar criticamente a aplicação de conceitos e princípios de diversidade em Psicologia;

  6. Criação de alianças de cooperação e apoio público. Procurar parceiros públicos e alianças que possam melhorar os sistemas existentes e implementar as ações sugeridas. Participar em protestos e criar condições para que minorias étnicas e raciais possam ser incluídas na investigação em Psicologia e incentivadas a participar em investigação e treino académico.

Embora estas recomendações derivem de um projeto cujo tema principal foi raça e etnia em contextos educativos, estas sugestões e recomendações podem ser extrapoladas e aplicadas de modo a melhorar a forma como vemos e interagimos com diversidade em diversos contextos.


Referências

Neblett, E. (20109). Diversity (Psychological) Science Training: Challenges, Tensions, and a Call to Action, Journal of Social Issues, 75(4), 1216–1239.

Rodapé

(*1) “Raça e Etnia são conceitos socialmente construídos e utilizados para identificar, categorizar e rotular grupos e pessoas. Estes termos fazem parte de processos mais gerais de racialização e etnicização de grupos humanos, que se encontram num contexto de relações sociais marcadas por assimetrias de poder e relações históricas de dominação (Vala 2015). Termos como pessoas ou grupos racializados/etnicizados têm sido bem-vindos pois colocam a tónica em quem racializa e sugerem o processo de construção. Embora existam vários debates acerca de terminologia, aos quais devemos estar atentos/as, usaremos também termos como raça/etnicidade; pois estes conceitos são frequentemente bases para construção de identidades, arenas de contestação de poder e eixos de opressão bastante reais;”

Carlos Costa